segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

HAITI: TERREMOTO DESMASCARA 'MISSÃO DE PAZ' DA ONU

Caio Dezorzi


Situação de calamidade após desastre natural revela para todo o mundo que a Missão da ONU, já há 5 anos e meio no Haiti, não tem resolvido problema algum, senão garantido a perpetuação de um sistema de exploração e miséria de todo um povo.

Todos ficamos chocados com as notícias e imagens que chegam do Haiti desde o dia 12/01, quando um forte terremoto destruiu a capital e várias cidades do país. As agências de notícia internacionais já falam em 70 mil corpos queimados e enterrados em valas comuns. Alguns analistas falam em cifras de 100 mil mortos, outros 200 mil e há os que falam em 500 mil mortos. Cerca de 3 milhões de haitianos estão desabrigados neste momento, um terço do país!

Também chegam notícias de que “aumenta a violência”. Repórteres relatam que a população sobrevivente faminta e sedenta começa a saquear estabelecimentos comerciais em busca de comida.

Os focos de violência nas ruas do Haiti, embora sejam casos isolados, são um problema de segurança que dificulta as tarefas humanitárias no Haiti, afirmaram hoje dois funcionários do alto escalão do Governo dos Estados Unidos. Tanto o tenente-general do Exército americano e subcomandante do Comando Sul, P.K. Keen, como o administrador da Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), Rajiv Shah, fizeram essa advertência em diversos programas dominicais da televisão americana. "Há casos isolados, mas nos preocupam e teremos que fazer frente a esse problema. Temos que estabelecer um ambiente seguro para poder ter sucesso com nossa missão de assistência humanitária", disse Keen, que coordena as atividades das Forças Armadas dos EUA nos trabalhos de resgate e reconstrução, à "CNN". (EFE, 17/01/2010)

Mas, por que uma semana depois do terremoto os haitianos sobreviventes estão sendo levados a saquear armazéns em busca de comida se a imprensa fala em congestionamentos no Aeroporto de Porto Príncipe com cargas de comida, remédios e água que chegam de todos os cantos do mundo para as vítimas do terremoto? A verdade é que a ajuda que chega, em grande parte, não está sendo distribuída aos desabrigados!

Muitos desabrigados se queixam que não receberam nenhuma assistência, apesar do aeroporto de Porto Príncipe receber verdadeiros engarrafamentos de aviões com cargas com mantimentos e remédios. (...) "Só sei que em três dias comi um prato de arroz que recebi de uma vizinha", contou Bobien Ebristout, que está em um barraco feito com quatro lonas em uma colina empoeirada de Peguyville, onde o cheiro de excrementos toma todos os ambientes. (EFE, 17/01/2010)

As agências de ajuda internacionais, contudo, alertam que muitos haitianos desabrigados ou feridos estão morrendo enquanto as equipes tentam superar o caos na organização da distribuição da ajuda. Alguns deles, afirma o jornal britânico ‘The Guardian’, criticam o controle excessivo dos americanos como parte do problema. A ONG ‘Médicos Sem Fronteiras’ diz que a confusão sobre quem comanda os esforços - os americanos ou a ONU - está atrapalhando a entrega de suprimentos de primeira necessidade a milhares de pessoas. "A coordenação não existe ou não está funcionando até este momento", disse ao jornal Benoit Leduc, gerente de operação da ONG em Porto Príncipe. (Folha de SP, 19/01/2010)

A grande quantidade de ajuda que chega ao Haiti demonstra que os povos de todo o mundo são solidários. Isso desmonta os argumentos daqueles que buscam atribuir à “natureza humana” a causa das injustiças e desigualdades por todo o mundo. A humanidade está pronta para a solidariedade, para a cooperação. O obstáculo é o sistema da competição entre os indivíduos, o sistema da propriedade privada dos meios de produção: o capitalismo.

E é a serviço do capital que as condições de vida no Haiti estavam já tão rebaixadas antes do terremoto, o que maximizou as conseqüências da catástrofe natural. E é a serviço do capital também que estão as tropas da ONU. Afinal, ao invés de os EUA enviarem mais 11 mil soldados armados ao Haiti para “fazer frente ao problema da violência” e “garantir um ambiente seguro”, não deveriam as tropas da ONU estar empenhadas em distribuir os mantimentos que chegam de outros países? E nas regiões onde o acesso é mais difícil, não deveriam os próprios soldados tomar a frente e abrir os armazéns onde há comida e distribuí-la aos sobreviventes?

O relato de um estudante brasileiro que estava no Haiti antes, durante e depois do terremoto, com um grupo de pesquisadores de antropologia da Universidade de Campinas (Unicamp), não poderia ser mais claro:

O que o Brasil e a ONU fizeram em seis anos de ocupação no Haiti? As casas feitas de areia, a falta de hospitais, a falta de escolas, o lixo. Alguns desses problemas foram resolvidos com a presença de milhares de militares de todo o mundo?

A ONU gasta meio bilhão de dólares por ano para fazer do Haiti um teste de guerra. Ontem pela manhã estivemos no BRABATT, o principal Batalhão Brasileiro da Minustah. Quando questionado sobre o interesse militar brasileiro na ocupação haitiana, o Coronel Bernardes não titubeou: o Haiti, sem dúvida, serve de laboratório (exatamente, laboratório) para os militares brasileiros conterem as rebeliões nas favelas cariocas. Infelizmente isto é o melhor que podemos fazer a este país.

Hoje, dia 13 de janeiro, o povo haitiano está se perguntando mais do que nunca: onde está a Minustah quando precisamos dela?

Posso responder a esta pergunta: a Minustah está removendo os escombros dos hotéis de luxo onde se hospedavam ricos hóspedes estrangeiros.

Longe de mim ser contra qualquer medida nesse sentido, mesmo porque, por sermos estrangeiros e brancos, também poderíamos necessitar de qualquer apoio que pudesse vir da Minustah.

A realidade, no entanto, já nos mostra o desfecho dessa tragédia – o povo haitiano será o último a ser atendido, e se possível. O que vimos pela cidade hoje e o que ouvimos dos haitianos é: estamos abandonados.

A polícia haitiana, frágil e pequena, já está cumprindo muito bem seu papel – resguardar supermercados destruídos de uma população pobre e faminta. Como de praxe, colocando a propriedade na frente da humanidade.
(Haiti: “Estamos abandonados”, por Otávio Calegari Jorge)

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